terça-feira, junho 01, 2010

ERA ECOZÓICA

Por Leonardo Boff

A expressão “ecozoico” foi criada por dois americanos, um cosmólogo, Brian Swimme, e por um antropólogo das culturas, Thomas Berry, co-autores da mais abalizada História do Universo. É a era que segue o cenozoico, há 65 milhões de anos, quando após a catástrofe que dizimou os dinossauros, os mamíferos conheceram um desenvolvimento nunca antes havido. Nós viemos deles.

A idade ecozoica representa a culminação da idade humana da globalização. A característica básica reside no novo acordo de respeito, veneração e mútua colaboração entre Terra e Humanidade. É a idade da ecologia integral, daí o nome ecozoica. Mais e mais conscientizamos o fato de sermos um momento de um proceso de bilhões e bilhões de anos. Encontramo-nos agora numa teia de relações vitais das quais somos co-responsáveis. Depois de tantas intervenções nos ritmos da natureza, sem cuidarmos das consequências prejudiciais, nos damos conta de que a revolução agora consiste em preservar o mais que podemos o legado da natureza e usá-lo com responsabilidade.

Está nascendo uma nova benevolência para com a Terra. Ela é como uma nave espacial com recursos abundantes mas limitados. Só com a solidariedade entre todos podemos fazer que esses recursos sejam suficientes para toda a comunidade de vida. Ou cuidamos uns dos outros e juntos cuidamos da Terra ou nave espacial cairá e desaparecemos.

Desta ótica surge uma nova ética. Por todos os lados surgem grupos que se orientam pelo novo padrão de comportamento. Representa aquilo que Pierre Teilhard de Chardin chamou de noosfera, aquela esfera na qual as mentes e os corações (sentido grego de noos) entrariam numa sintonia fina, caracterizada pela mutualidade entre todos, pela amorização e pela espiritualização das intencionalidades coletivas. Estas se coordenariam para garantir a paz, a integridade da criação e o substrato material suficiente para todos. Livres e desafogados podemos, então, viver nossa dimensão específica de con-viver humanamente, de conjugar trabalho com poesia, eficiência com gratuidade e de poder brincar e louvar como irmãos e irmãs, em casa.

Essa consciência de mútua pertença Terra-Humanidade vem reforçada poderosamente pela visão que os austronautas nos possibilitaram. Sigmund Jähn, ao regressar à Terra, expressou assim a modificação de sua consciência: “Já são ultrapassadas as fronteiras políticas, ultrapassadas também as fronteiras das nações. Somos um único povo e cada um é responsável pela manutenção do frágil equilíbrio da Terra. Somos seus guardiães e devemos cuidar de nosso futuro comum”.

Essa percepção da Terra vista fora da Terra dá origem a uma nova sacralidade. Talvez o sentido secreto das viagens ao espaço exterior tenham esse significado profundo, bem expresso por outro austronauta J. P. Allen: "Discutiu-se muito, os prós e os contras com referência às viagens à Lua; não ouvi ninguém argumentar que deveríamos ir à Lua para poder ver a Terra de lá. Depois de tudo, esta foi seguramente a verdadeira razão de termos ido à Lua”.

E de lá da Lua, não há distinção entre Terra e Humanidade. Ambas formam uma única entidade. A Humanidade não está apenas sobre a Terra, ela é a própria Terra que se comove, se volta sobre si mesma, ama, cuida e venera.

Transformar essa consciência num estado permanente, sem que precisemos pensar, significa viver já dentro da era ecozoica. A Carta da Terra, pensada a ter o mesmo valor que a Carta dos Direitos Humanos, vem perpassada pela visão ecozoica. Em sua introdução diz: “A humanidade é parte de um vasto universo em evolução. A Terra, nosso lar, está viva com uma comunidade de vida única…O espírito de solidariedade humana e de parentesco com toda a vida é fortalecido quando vivemos com reverência o mistério da existência, com gratidão pelo presente da vida, e com humildade considerando o lugar que ocupa o ser humano na natureza…A escolha é nossa: formar uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos outros, ou arriscar a nossa destruição e a da diversidade da vida”. Essas mudanças, não obstante os obstáculos que a era tiranossáurica cria, estão penetrando na consciência coletiva e irradiando sobre todo o curso da sociedade.

A realização da globalização humana e ecozóica representará o fim do exílio. As tribos todas da Terra a partir de agora se encontrarão na grande taba comum, no ilê comunitário, no seio da grande e generosa Mãe Terra. Em fim ...

L.Boff

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